sexta-feira, 22 de abril de 2011

Chuva de refrigerante

As pérolas, o escorregar escada abaixo, o travesseiro no ar, os sorrisos alheios, o pular, o gritar, o livre dos braços, o movimento leve, o cantar extravasado, os cristais reluzindo, o bizarro, os porcos cor-de-rosa, as luzes muito bem iluminando, as funções tidas como boas e fáceis, a convivência gostosa, o futebol, a comemoração, a bola, a torcida, o gol, a corrida em pista dura, o medo de cair, a tinta vermelha, o morcego na quadra, as almofadas grandes, a televisão recém instalada, a dança esquisita, a crise de riso, a vela acesa, a fogueira, o violão, o canto conjunto, a noite não dormida, a noite conversada, a noite tocada, os sorrisos no silêncio, os movimentos calculadamente silenciosos, a contenção mais extravasada, o braço dado, o correr junto, o junto ofegante, o céu de estrelas, o ver de estrelas conjuntas, o ver conjunto, o livre e junto escutar, o ouvir de declarações, o rir delas, os cartazes coloridos, as feiras, a criatividade, o geladinho azul, o picolé de chiclete, a figurinha do álbum, o cheiro de banca de jornal, a canetinha, o giz de cera esquecido, a cola bastão, a cartolina vermelha, as jujubas de todas as cores, a música da banda nova, a capinha decorada do cd, o peixe no aquário, a psicina povoada, o biquini emprestado, a calça sem bainha, a moda listrada, os macaquinhos e as zebrinhas, os ônibus de excursão, os recém conhecidos, a festa de quinze anos, todas as valsas da vida, o abajur francês quebrado, o perfume francês roubado, o perfume venezuelano exaltado, as princesas, os príncipes, os casamentos reais, a nostalgia, os palácios, as roupas, as nostalgias, os doces, a nostalgia, o deja vu, a estante de bolos verdes. E tudo que é verde. E tudo que se faz colorido. E toda felicidade reina no canto. E logo ao lado. No cenário, chove a chuva de pressão de garrafa aberta. Chove a chuva fina e gostosa. Chove a chuva melada que une a todos. Chove refrigerante. Um brinde a tudo isso e a todo o resto.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Rio de janeiro

*E creio não conseguir me colocar sobre a tragédia que aconteceu hoje no Rio. Isso porque, literalmente e de uma vez por todas, me deixou sem palavras. Rosas e sentimentos mentais para os que foram e os que esperam, no constante luto e eterna esperanças de um povo forte e enraizado. Todos os dias esse vai e vem, e a vida se repete na estação. Faça valer, mas nada vale vidas. Meus mais sinceros sentimentos e amor.*

Dorzinha

Tinha aquela dose de pressentimento, percebe? Aquela coisa do fundo da alma que cotuca. E cotuca...Aquela consonância de coisas não ditas, que já deixaram de magoar há tempos e que ofuscam tanto o sentimento. Uma coisa infantilizada, até, um soar profundo e preso, enclausurado. Sabe? Sabe do medo de perder o sentimento? Conhece aquele medo de deixar de ser sentimental? E partir dessa para onde, para a onda, para a vida. E, principalmente, para o que não se conhece. Entende quando as lágrimas alheias vão e voltam dentro da gente, quando o fluxo carrega e descarrega e quando se pára para pensar? Que de tantos fatos escreveria três vezes, mas que de tão relacionados se escreve uma. Nota. Nota e percebe e sente que a prole do que vem depois acabou, e então o que virá? A prole acabou. Acabou a renca de dor, a raiz de dor. E porque a raiz da dor se doa para a de felicidade, e raios de felicidade se voltam para a dor? Falo da dorzinha de aurora, a dorzinha escondida, ê dorzinha complicada e triste e viva e dolorida. E duvidosa. Aprende-se aos poucos que cada dor é dor, e que o outro de fato a sente. Ainda que seja a dorzinha do fundo do espírito. E vê se compreende, que até dor de amor é dorzinha. Que se perde quando se esgota, mas, sobretudo, se faz perder. Que a decisão é dura feito pedra e diamante incrustado, e que incrusta na pele e se faz valer. Ou não. Pensando bem, olhando profundamente ao dentro. Observe e vide e veja. E ouça o barulhar do fora, os barulhos das madrugadas, tão bonitos para serem ditos morcegos e grilos e cigarras. Mais bonito seriam morceguinhos, grilinhos e cigarrinhas. A noite se impõe negra, mas é clara. Não tão clara como a dorzinha verde que assola o ladinho, o cantinho, o coração. Coraçãozão, de papel, de viés, de júri. Tema todas as responsabilidades, entretanto, saiba que não são todas suas. Afinal, o mundo todo, por vezes tolo, não é responsabilidade de ninguém, mas é responsabilidade de todos. Perder um pouco da responsabilidade sobre si, e deixar de pensar. O mundo exige dos quais se doam em sentimento e pede compaixão, e quando se dá compaixão e sentimento pede toda a seriedade. As pessoas pedem seriedade. E a amnésia assola toda a terra. Uma amnésia sentimental generalizada assola a terra. Há uma epidemia que quebrou todos os laços e promessas de vida. Dorzinha verde, apaziguar-se-irá. Desejo a você todos os votos de paz. E vá. Amasse, faça doer, mas vá. E quando for, deixa só a noite no fundo. Escura, mas clara. Para iluminar todas as vidas sob sua proteção.