quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Fantasmas Felinos

Contava que, naquela época, gostava de caminhar a observar a grande represa. Era água a maré, água inimaginável, parecia mar. Não tinha ares de mar, mas tinha vista tal como a que ele proporcionava. Encontrava os como ela, que caminhavam ou corriam. Encontrava com pedreiros que construiam quiosques. Encontrava com as tentativas de formar ali um jardim botânico, para obstruir a linda vista maritima como lindas (ou não tão lindas) árvores. Curiosamente, em certo ponto, encontrava com gatos. Muitos gatos. Gatos demais. Gatos daqui, gatos pra lá, gatos acolá, gatos ali. E os gatos se misturavam com as capivaras. É de se imaginar que a Senhorinha Dona daquela casa era por demais sólida, sofria de mania de gatos, pois logo se via que tinha muitos gatos. Eram gatos negros, gatos mesclados, gatos parecidos com os de antigos amores, gatos brancos, gatos de todos os tipos. Eram tanto os gatos que começou a intrigá-la. Pensava que além disso a Senhorinha era fria por demais, por acontecer de deixar tantos gatos por ali, perdidos na vida e da vida, a olharem a paisana, sem comida certa, com muito sol, sem expectativas, sem dia seguinte. Pois gato haveria de querer ser gente na vida? Com certeza sim, quem não almejava pelo sol do dia amanhã? O gato talvez não quisesse tanto assim o sol. Por vezes devia apenas querer um dia nublado, mas poderia apostar que sonhava com o dia. Com o próximo dia, a próxima noite, a próxima refeição. E quem dirá que essa viria? E lá estava um gato imponente, que não se afetava com a dita situação, não se incomodava com a falta de comida e, caso se incomodasse, não pareceria se incomodar. Pois bem, encarou-o. Estava estático como estátua, intrínseco e tal como um tetânico que não sai do lugar. Nem ligou para seu olhar intimidador. Afetou sua alma, balançou a auto-estima, mexeu com algo de dentro. Cambaleou as pernas, se sentiu ofendida pelo encarar duro e comprou a briga pessoal do gato que a fez sentir mal. Olhou uma última vez, e lá estava a estátua felina. Branca com manchas claras e esverdeadas. A verdade é que o gato não se afetava com ela. Nem mesmo o gato. Resolveu que iria chamá-lo de um gato. E saiu logo dali, fugindo de todos os seus fantasmas.

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